No último texto eu comentei sobre como os dados dos clientes podem gerar valor ao seu negócio e como muitas empresas não os utilizam de maneira estratégica. No entanto, esse é um assunto que, dada a sua relevância, merece ser explorado sobre outras perspectivas, então hoje eu decidi me aprofundar um pouco mais nele.

Sabemos que existe uma ampla variedade de dados, que podem ser obtidos a partir de diferentes fontes: há dados transacionais, dados sell in, dados sell out, dados de varejo… enfim, eu poderia usar um parágrafo inteiro para citar apenas uma parcela ínfima dos inúmeros tipos de dados que podem ser coletados, mas essa não é a minha intenção ao escrever esse texto.

O ponto onde eu quero chegar é que cada um desses dados pode ser transformado em valor, e eu não me refiro necessariamente a valor monetário, mas valor para a própria operação, que inevitavelmente acaba sendo dinheiro de maneira indireta. Então sim, dados podem (e devem!) ser convertidos em receita para o seu negócio.

Os dados se mostram extremamente importantes em qualquer empreendimento, quando buscamos, por exemplo, definir a persona do negócio. A persona representa o perfil do potencial cliente, e essa definição só é possível a partir da análise de um conjunto de dados relacionados ao comportamento do cliente, que demonstram como ele pensa, o que sente, quais são as duas dores, desejos, necessidades, grau de instrução, localização geográfica, faixa etária, gênero, quais são os seus interesses, dentre outras informações relevantes. Nesta etapa, o foco na coleta e análise dos dados é a captação de leads.

Com o negócio em pleno funcionamento, os dados, se usados de maneira adequada, permitem uma melhor segmentação dos clientes, o que possibilita que sejam feitas ofertas personalizadas baseando-se nos interesses de cada um. Outra estratégia muito utilizada é enviar convites e ofertas nas datas em que este ou aquele cliente costumam frequentar o seu negócio. A ideia é simples: surpreenda o cliente tomando como base o seu próprio comportamento de compra. A ideia aqui é encantar, para posteriormente reter.

Quando você utiliza os dados de maneira indireta para reforçar o conceito de centralidade do cliente, sem nenhuma pressão ou agressividade, mas, na direção contrária, mostrando que você o conhece e deseja ajudá-lo, ele se sente especial. E acreditem, essa simples atitude pode fazer toda a diferença na hora de transformar aquele consumidor esporádico em um cliente fiel e promotor da sua marca.

Os dados também podem ajudar a atender melhor o seu público-alvo. Suponhamos que você tenha uma central de atendimento e que já saiba como é a jornada de compra de cada cliente. Desta maneira, quando falamos em centralidade do cliente, nos referimos a iniciativas que conectem esse cliente ao seu negócio, de modo que gere valor, já que nem sempre essa conexão pode ocorrer de maneira positiva.

Então, se é para ter, faça direito: use os dados de maneira efetiva, e quando o cliente se identificar, usando seu CPF, e-mail ou número de celular, e fizer o login, você já saberá o seu nome, a última vez que ele visitou a loja, os produtos que ele adquiriu, o quanto ele geralmente gasta e até mesmo a forma de pagamento que ele geralmente utiliza, isso tudo se você tiver um CRM, é claro. São poucas as pessoas que fazem isso efetivamente porque, de fato, é algo difícil, mas apresenta um retorno a longo prazo extremamente interessante.

E tudo que falei até aqui, me refiro ao modo como os dados podem gerar valor dentro de casa. E você, nesse momento, pode se perguntar: mas e quanto a transformar os dados em receita fora de casa, Christian? Também é possível?

A resposta é sim. Mas da mesma forma, é necessário que seja feito um planejamento estratégico para extrair o máximo de valor possível daquele material, algo no sentido de lapidar uma pedra preciosa com o intuito de aumentar o seu valor de mercado.

Tem muito varejo que vende os seus dados brutos para a indústria, porque ele enxerga que esta é uma forma de gerar receita. E realmente é, isso não é algo que eu possa colocar em questionamento. Entretanto, é uma receita que se encerra por aí, pois ao vender o dado bruto, você já ofereceu o máximo que podia dele. E o ponto central aqui é: como você o transforma em valor para um mercado fora do seu segmento, para as indústrias ou para o seu ecossistema sem vender os dados brutos?

Ora, é possível transformar esses mesmos dados em indicadores, categorizações ou relatórios, o que acaba gerando muito mais valor a partir dos mesmos recursos. Podemos fazer uma analogia com o conceito da matéria-prima, onde você vende essa matéria-prima por um preço, e quem os adquire transforma e a vende como produto acabado, obviamente por um valor superior ao material na sua forma bruta.

O varejo tem que entender e, principalmente, investir tempo para pensar nessas questões sob uma nova perspectiva. Ao invés de vender os dados diretamente para a indústria, por que não trabalhar em parceria com outros setores e aumentar a receita? Associar-se a outros segmentos do mercado e extrair o melhor daquilo que se tem seria mais viável do que simplesmente vender os dados brutos? O que é mais rentável: explorar a matéria-prima na sua forma bruta ou buscar os meios para vendê-la como um produto acabado e consequentemente de maior valor no mercado? Essas são algumas das reflexões que eu gostaria de instigar em vocês hoje.

Christian Vincent

Sobre o autor

Christian Vincent é engenheiro formado pela UFRJ, com mestrado em administração pela Puc-Rio e curso de extensão em Business na Kellogg School of Management. Possui um mix de experiências, desde executivo de grandes empresas a fundador de startup. Ao longo de sua carreira passou por grandes empresas do segmento de pagamentos e bancos como Fininvest, Itau-Unibanco, Cetelem, Firstdata, Tribanco, Neurotech e, ao longo dessa trajetória, desenvolveu fortemente a relação com os principais varejistas do país. Foi o fundador da startup IZIO que criou em 2014 e vendeu para o fundo Hindiana em 2022.